terça-feira, 30 de junho de 2009

Ainda sobre o Rei do Pop,


Michel jackson. de quem sou fa, incondicional.
Porque nao posso viver sem o banal e sem banalizar. Essa gente que nao consegue se conter e canta e danca e vai pra rua e celebra a vida, essa coisa erudita. Adoro o populacho, o escrachado feliz dos coloridos que nao combinam mas compoe a alegria. Venus vaga sem freios. (sim, estou citando Durao, 1781) .
Marca registrada das minhas fotos. Mas isso eh so para quem conhece Pop Art, claro.
Por falar nisso: pedi para o Amilcar, o Torrao, escrever um introito para as minhas fotos. Mas ele tah muito ocupado arrumando a mala para Barcelona e depois, Berlim. :)

segunda-feira, 29 de junho de 2009

A Flor do meu Segredo


se chama Samir. Por quem me descabelo e me descabela. (sim, estou citando Ovidio). Porque qualquer coisa ou pessoa que seja previsivel, que busque o basico e nao caia na folia, me cansa. Entao, nao disfarco. Aprendi com o velho e bom Mauricio Loureiro Gama aquela questao, aplausos, coisa de gente comum. Meu avo me explicava que em cena soh distinguimos as luzes. As pessoas acabam pagando um preco para fazer parte da plateia.
mas porra louquice eh fundamental. E nao sou professora disso.
Em tempo: mulheres para elogio: Caroline Vanconcelos, Anna Vilanueva, Vanessa Gai e Flavia Oller. O resto penteia o cabelo.



"Gonna dance on the floor in the round..."

sábado, 27 de junho de 2009

Judaicas


Passei o cabalat shabat com uma familia religiosa, os Menachem. Linda familia, lindo apartamento, comida e rezas fartas, me refastelei. Eles ficaram muito felizes. Parece que adivinharam que meu microondas explodiu na hora exata em que tambem tenho pouco dinheiro para comprar comida, devido ao fato, claro, que o dinheiro da comida tem que ir todo para as outras coisas mais importantes da vida: livros, traducoes juramentadas, perifericos que quebram no computador. Voltei da casa dos Menachem com a exata sensacao de que eles tinham cumprido uma mitzva, que estou lotada de bencaos, e que, realmente, eh uma delicia providencial receber ajuda de desconhecidos. Kaballah.
Obrigada aos Menachem que compartilharam sua mesa comigo e nada sabem do que estah acontecendo, ie, gastos doutorais.
Ja a boia da Havdala vai ser filada na casa do Yehuda. Seus pais chegaram do Brasil e irao conhecer hoje os amigos israelenses do rebento inteligente que colocaram no mundo. ;)




sexta-feira, 26 de junho de 2009

Volver

Seu nome eh Clarita. Tem 90 anos. Possui duas filhas, Estela e Lila que me contrataram para "mima-la". Devo passar todos os domingos, por dez horas, fazendo companhia para a Sra. Clarita: ouvir suas historias e conversar sobre politica e literatura. As filhas me explicam: la madre eh mui culta e tudo indica que eu sou a pessoa ideal. E tambem muito carinhosa.

Vou conhecer Sra. Clarita. Levo um pequeno susto: estava me esperando com um doce sorriso no rosto. Me estendeu as maos, um agrado. Pareceu-me que ela eh que vai fazer companhia para mim, claro. Conversamos sobre El Cid e Don Quixote De la Mancha.

As filhas, muito risonhas, assim como a propria mae, que nao para de dar risadas, fizeram-me rir tambem. Sao agudas. fazem observacoes inteligentes e nao aguentei, gargalhei. Sra. Clarita aprovou. Assim fui contratada.

A gargalhada. Lila e Estela, as filhas, me explicaram, criticando a mae, claro, que havia mil canais na televisao mas que a Sra. Clarita nao assistia a nenhum, nem ligava a televisao.

Sra Clarita, retrucou, explicando-me:

"Los conflitos familiares sao mais interessantes. Io prefiro"









quinta-feira, 25 de junho de 2009

Parada Gay em Jerusalem/ Gay Pride in Jerusalem 2009

( Protesto de Judeu Ortodoxo contra a passeata gay em Jerusalem. No cartaz: "Eles se parecem como animais". Muito Triste. Photo: Shlomit Or)

Foi uma delicia. Muita gente: feliz, tranquila, rindo, familias e familias, criancas por todos os lugares, e muita, muita festa. Tinha uns 300 fotografos, encontrei com quase todos, e por varias vezes, ficavamos em 3 ou 4 fotografando a mesma pessoa ou a mesma cena.

as fotos escolhidas, no estilo " olhar de Shlomit Or", ja estao no outro blog:

www.photojerusalem.blogspot.com

aqui so coloquei o making of dos Ultra Ortodoxo. Muito triste.

A Kabalah da Ajuda

Esses dias foram quase intensos para mim. Digo quase por causa da Kaballah. Quem me conhece ha muitos anos sabe que para alem dos estudos academicos participo ativamente de um grupo de Kaballah. E uma vez kaballah, sempre Kaballah.

quero agradecer aos que tem me ajudado, portanto. Devido ao meu apego a Kaballah, estou sempre consciente e atenta para o modo como a pessoa se porta quando ajuda.

Para a Kaballah voce somente ajuda uma pessoa quando, literalmente, arranca um pedaco do que voce possui para dividir com ou outro. Explico melhor: dar, o que estah sobrando, nao eh compartilhar e nao cria a rede. O seu ato soh tem efeito se:

1) a pessoa pedir ajuda ( sim, a pessoa deve pedir, Voce nao pode oferecer. Se oferecer, mesmo que a apessoa aceite, nao adianta para a rede)

2) Ao ajudar voce deve dividir o que tem e nao o que esta, digamos, sobrando. Nao pode ser algo facil para voce.

3) A pessoa ajudada deve levar os atos acima adiante. Se ela soh "receber" nao cria a rede. Ou seja, ela precisa ficar consciente.

A lei da Kabalah assegura que : " se conhece uma pessoa pelo seu bolso, seu coracao e sua Ira"

Prestar atencao no modo como voce ou uma pessoa leva a mao do bolso ao coracao e do coracao ao bolso eh um exercicio de conciencia, portanto, Kaballah.

Sobre bencaos: ou sobre "retorno" do bem que fazemos aos outros. Aas bencaos nunca chegam pelo caminho ou pessoas que estamos esperando. Ao contrario, chegam por outras vias, inclusive de desconhecidos. Eh preciso estar atento porque voce pode estar lotado de bencaos a sua volta mas como estava esperando uma resposta vinda da pessoa que voce ajudou nao pode perceber que estah lotado de bencaos. Certamente nao sera a mesma pessoa que voce ajudou que fara o receptaculo para a sua bencao. Isso assegura a incondicionalidade do seu ato de ajudar. Na Kaballah nao existe " favor". Se voce por acaso acha que fez um e nem recebeu um agradecimento, dancou, sua ajuda era lotada de condicionalidade.

Quero, portanto, deixar meus agradecimentos, nesse momento que estou necessitando de ajuda por causa do doutorado para:

Alcir Pecora, Joao Adolpho Hansen, Marcello Moreira, Hugo Lior, Renata Barco, Ana Villanueva, Eduardo Weiss, Erwin Maack, Amicar Torrao Filho, Raphael Cohen Nissan, Yehuda Cavalli.

Pela Incondicionalidade com que compartilharam os seus intelectos e/ou bolsos, sem em nenhum momento, sentirem vaidade pelo ato.


A rede foi criada: Uma vez Kaballah, sempre Kaballah


terça-feira, 23 de junho de 2009

Parada Gay em Jerusalem/ Gay Pride in Jerusalem 2009

Queridos e Queridas:

aqui vao noticias sobre a parada Gay em jerusalem que acontece no dia 25, depois de amanha.

Vou estar lah, fotografando, simpatica aos direitos humanos e a todas as pessoas do mundo que sao felizes, batalhadoras e corajosas.

"This year's gay pride march (June 25) will march in the opposite direction from the route of the last two years. It will start at Gan Ha-Pa'amon at 4:00 p.m., with the march itself beginning at 5:00 and proceeding to Gan Ha-Atzmaut for a rally at 6:00 p.m. In a way, I think the route change is a pity, since for the last two years it's meant that one can then easily walk further on to Emek Refaim to enjoy hanging out with friends after the rally. It should be fun, in any case, as long as there aren't Haredi riots against the march."

Fonte: Rebecca lesses In: http://mystical-politics.blogspot.com

Nos vemos la!



quinta-feira, 18 de junho de 2009

The unrest in Iran makes me green with envy


(No HaAretz de hoje. Postura inteligente: excelente inicio de dia. Para mim, claro)


it makes one green with envy: The scenes from Iran prove that some nations are trying to take their fate into their own hands. Some nations are not floating on the surface in sickly indifference, some are not looking around in endless complacence. And some are not following their leaders with the blindness of a herd. There are moments in the histories of certain nations when the people say enough. No more.
Czechs and Ukrainians, French and Russians, South Africans and Palestinians, Thais and Chinese, Lebanese and now Iranians have taken to the streets on at least one inspirational occasion and tried to make an impact. Some succeeded, some failed, but at least they tried. They did not surrender to their failed leaders, who dragged them from bad to worse. This is not only about rising up against a tyrannical regime; sometimes it's about a struggle for justice in democracies, too. That struggle is not conducted only in polls and elections; such struggles must spill out onto the streets. Here, too.
The scenes from oppressive Iran are of light breaking through. Thousands of women and men protesting and demonstrating, holding signs and shouting out loud. They stand with their faces visible, fearless. All of them are at risk because of their protest. Perhaps less than what we imagine here - our learned analysts know that there is only an Iran of darkness - but certainly much more than in free Israel.
But while Iran's women are taking a risk and demanding that their voice be returned to them, Israel's women are wrapping themselves in silence, from the mall to the parking lot. As Tehran's men cry out "Where is our voice?", here they ask "Where will our next vacation be?" Here in the SUV, there in the streets. Here in front of the stupefying television screen, there in front of the forces of evil. Here in darkness, there in the light of popular protest.
We only take to the streets when there is a festival, hardly ever because of a scandal. Tel Aviv's centennial or the book festival, the beer festival or the tomato festival - but never in protest. In Iran they are fighting for liberty, here for vacation time.
It's true, there is liberty in Israel, but only for us, the Jews. We have a regime that is no less tyrannical than the ayatollahs' regime: the regime of the officers and the settlers in the territories. But what do we have to do with any of this? In Iran, police disperse demonstrations with violence, they shoot and kill. And what do we do?
When you get a chance, go on Friday to Na'alin or Bil'in and see what happens there. Demonstrators are killed here with similar brutality, but in Iran the crowd is standing up to a tyrannical regime, while here only a handful of brave people stand up to the Border Police, who are firing weapons. Moreover, we hardly write anything about the protest being silenced with bullets. It interests no one, and this, too, is called democracy.
A democracy is not tested only with elections. A democracy is measured in everyday life. National aims are not achieved only through power hungry politicians; the street must also speak. In the latest polls, 64 percent of Israelis say they support a two-state solution. Great. But when Israel moves steadily away from such a solution, when the prime minister takes a small step forward but then raises more and more impossible obstacles, no one thinks to do anything. Have you heard a single political conversation recently? Nothing.
One can only imagine what would have happened if the day after Benjamin Netanyahu's speech, that same silent and paralyzed majority that allegedly wants two states had taken to the streets to demand an end to the occupation. Or if they demanded that we say yes to the Arab peace initiative. What a boost that would have been, a genuine wind of change on whose strength Barack Obama, Netanyahu, Mahmoud Abbas and Bashar Assad could move forward together.
But when the street is silent, only the leaders are left, and their survival drives them.
Israel is now at a fateful crossroads, no less than Iran. An opportunity lies before it that will not be seen again, one that affects the future of all its people no less than the election results in Iran affect the Iranians' fate. Missing the opportunity here will be just as decisive as four more years of Mahmoud Ahmadinejad in power. But look what is happening in totalitarian Iran and what is happening here, the sole democracy in the Middle East, blah, blah, blah.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Como se Faz Hospitalidade


Portrait Eduardo Weisz at Hebrew University



Às oito da manhã em ponto, na praça Edmond J. Safra no campus de Givat Ram da Universidade Hebraica de Jerusalém, em frente a larga fonte despejando fios de água, Eduardo Weisz me esperava de sandálias croc marrom, calças pretas, mãos no bolso, camisa branca, e, solidéu colorido na cabeça. Era o começo de uma manhã cuidadosa em não colocar nuvens brancas no azul. Durante cinco horas Eduardo, o Weisz, fez tudo o que eu deveria fazer: fotocopiou meus diplomas, imprimiu e encadernou minha tese de mestrado, pagou uma fortuna por tudo isso - observando que era um presente- andou de lá para cá, perguntou aqui e acolá, conversou, questionou e agradeceu secretárias, sentou-me para o café das dez, repartiu o hummus com pita e brachá do almoço das doze, explicou-me todas as bolsas de estudo, um pouco de Kierkegaard, o caminho da minha próxima casa e me despediu, quando tudo pronto, com o empréstimo de livros que eu deveria ler, a única exigência que fez nessa manhã talmúdica, finda nos dois livros que carreguei nos braços como se o universo fosse, definitivamente, manso, redondo, confortável.
Eu nada fiz por mim. Nem um sopro de vento nessa manhã macia em que começou o meu processo de doutorado na Universidade Hebraica de Jerusalém, locus amoenus.

domingo, 14 de junho de 2009

Luzinha em versos by Leones


MOFNEI SHABAT

luciana de repente
e
dolorosamente
se despe de shlomit
hoje cedo foi à univers
idade
tratar dos papéis
o doutorado acercando-se
dela ela disse
agora tenho um futuro
como se fosse
talvez seja
ter um futuro
é uma má notícia

ANDRÉ DE LEONES

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Rua Monte Alegre, Perdizes

para Luciana Gama.

no limbo dos que continuavam vivos
o velho haroldo
via luciana rir
nos intervalos entretranscriações

André de Leones
12.06.2009

domingo, 7 de junho de 2009

GORDA GORDONA

Conto de Eduardo Sinkevisque.

Para Luciana Gama.

Rapunzel jogou suas vistas. Engano redondo. Tranças redondas em gomos. Um oito, uma música numa oitava acima. Um zero em cima, outro em baixo: quem ousa brincar de cima em baixo? Um por cima, outro por baixo. Redondo engano. Todo começo. Todo desenho. Todo poema redondo que conto. Então, Sr. Seu Pinto, continua, e aí?

Rapunzel jogou suas tranças. Aquelas que nos trançam em vistas e abrem maços de margaridas, no pinto, pinta que pinto, te pinto como o Sr. Seu Pinto.

Ele não era um invólucro, nenhuma subjacência, mas desinências de gênero correndo risco. Seu Pinto era os gomos, os comos nos gomos que faziam tranças: pegue no lápis, aponte, na benga - quando os meninos mostravam sua máxima potência, afirmando-se homens por terem pintos, pintos... Então, Sr., continua: Rapunzel engomou as vistas, salvou as do príncipe aos poucos. Não te explico, porque não te explico... explicam teus olhos quando piscam.

Quando o caminhão de gás ia embora, saindo da porta das casas, balões amarelos abriam tangerinas, margaridas, fitas e cortinas de papel nas vistas. Jogue-me, Rapunzel, as suas. Um dia, certos olhos dissociados de certo corpo bateram olhos em outros gigantescos. O negro era amarelo-roxo. O roxo, amarelo, redondo ovo, redondo ondo. Repuxavam ondas em pálpebras, pupilas nos leitores de Cecília em cílios de gato, piscando samba, gatomaquia. Ovais de olhos quase mais que redondos.

Outro dia, uns tantos faziam o que nunca tinham feito: se olhavam. Olho no olho, entre olho. Engano redondo: Gorda Gordona tinha olhos gordos, daqueles de regalar as vistas quando vistos. Quando o caminhão de gás saía, os de boi, taurobovinos, enxugavam-se. Gorda Gordona sabia que engordava os olhos de quem a via. De gorda não tinha nada, de boba também nada tinha. Seus olhos sabiam, neste é irmão deste, que os olhos de quem a via viam olhos magros de pupilas de leitores de Cecília engordarem em galos na cabeça. Tatiana batia nele, dilatando-se: coq que é coq forma galo na cabeça. Flosi jogando milho. Gorda Gordona catando: coq que é coq não dá stop.

Então Seu Pinto, o que dizia Maria na Paulista? Certos olhos não tinham esquinas. Vinham no ônibus. Na paisagem fixa das esquinas, nas janelas do ônibus quando passava pela Paulista. Cecília perdendo neons em folhas heróicas, veias heroínas da Paulista em ruínas quando Tatiana achava Tatianas, perdendo o fundo dos olhos, o Sena dos olhos no cerne das esquinas.

Certos olhos vinham no ônibus, no corredor corre mão dos olhos dos outros. Sr. Seu Pinto pediu mais quatro. Quatro enganos, desenganos, com os do forno mais de seis gomos. Gordas, gordas, nenhuma gorda, como Gordona a viam.

Seu Pinto vinha no ônibus. Gorda Gordona o olhava. Ele pediu sua mão: guia-me por onde fores, que te perdôo por me traíres. Depois daquele encontro, nunca mais foi o mesmo. Depois daquele beijo. Depois de aproximá-la dentro.

Olhos de quem a via abriam pernas, a Gorda G. que gostava de abrí-las. Seu Pinto, cleptomaníaco, tinha ciúme. Botava os olhos nos olhos gordos que a cobiçavam. Pedinte, devolveu os quatro. Olhos de onde viam, de onde vinham, faziam o que nunca tinham feito.

Um dia, Gorda G. , com aquelas suas lágrimas de doce de leite, com aqueles seus olhos de copo de leite, disse que as pessoas não precisavam de regimes. Disse a Seu Pinto que elas precisavam de óculos fundo de garrafas. Desde que as garrafas fossem cheias de olhos fundo de garrafa.

Seu Pinto virou príncipe quando os príncipes bateram os olhos nele. Gorda Gordona leu Memórias Póstumas de Brás Cubas, contando a ele por telefone. Suas memórias e a publicação póstuma com a morte do amor que mata, e o amor que se mata com a morte.

Ah, Gorda Gordona... que nada! A palavra lhe dava raiva, quando mal usada. A Gorda G. que engordava os olhos de quem a via. Seu Pinto quando olhava: quanta pele, quanta carne, que de gorda não tinha nada, se não fosse por ele também nada tinha. Se iludia quem a olhava e engordava quem gorda ela achava: Cecília usando botas, retirando stops quando o ônibus parava. Gorda G. nele tonteava. Todo redondo. Todo ovo. Todo ônibus redondo sem olho, sem rosto, testa, cabelo. Redondo dois pontos: o corpo de Gorda Gordona se abria sem ponto, frase, vírgula ... De novo, Gorda Gordona, dois pontos: Seu Pinto pegou as vistas. Pecou em alongar-se, alagar-se. Alongar-se em avisar que se alongaria.

Como era mesmo aquela cantiga? Uma música, um oito numa oitava acima: um maço de margaridas despejadas por um menino. Deixa que te conte. Gorda que te engorde: depois daquele beijo, engordaram de língua na boca, na boca em namoros. Seu Pinto pedindo beijos de língua na boca. Língua engordando na boca. Seu Pinto gordo no ônibus e Gorda G. virando mulher.

Outros olhos: havia? Outros gordos que a viam. Os olhos de quem a via viam conversas engordando:

- Deixa que te conte, jogue-me sua estória. Gorda Gordona que de estória não tinha nada, engordava. Mais nada. Os olhos de quem a olhava. Mais nada. Não tinha palavra. Quem lia não via mais nada. Quem não via o que havia, não engordava. Quem no gás em gomo engano engordava. Mais nada. Nadava ao cais do dia em que Seu Pinto lhe carregasse flores:

- Fosse o que fosse no dia em que Seu Pinto fosse lhe dar flores.


...

Eduardo Sinkevisque
1989-2009

sábado, 6 de junho de 2009

Shlomit (s)


Amos Oz me proporcionou* em sua biografia (de amor e trevas) mais uma clave para a minha Jerusalem. Narrando sobre sua avo, Shlomit, maniaca por limpeza desde que pisou aqui na cidade em 1933 e proferiu a frase que repetitiria por toda a vida: "O levante eh cheio de microbios" . Amos rele sua avo Shlomit, observando  o impacto das cores e cheiros do Oriente numa imigrante  que veio de uma cinzenta aldeia da Europa oriental e ficou apavorada -assim como todos os imigrantes, assevera Amos- com a transbordante sensualidade de Jerusalem o que, segundo Amos, se tornou  uma ameaça cuja unica protecao era construir guetos para si mesmo:

"ameaças? A verdade e que nao era para se proteger das ameaças do Levante que minha avo mortificara e purificara o corpo em banhos escaldantes nas manhas, tardes e noites de todos os dias de sua vida em Jerusalem, mas sim, ao contrario, pelo fascinio que seus encantos sensuais exerciam sobre ela, pela voluptupsidade do seu proprio corpo, pela atracao poderosa dos mercados que transbordavam e fluiam e ondulavam impetuosos a sua volta, deixando-a quase sem respirar, com uma vertigem na boca do estomago e um incontrolavel tremor nos joelhos pela abundancia de verduras, frutas e queijos tentadores e pelos perfumes penetrantes, entorpecentes de todas essas comidas estrangeiras e estranhas que a excitavam, e as maos gulosas e insaciaveis que apalpavam-penetravam ate o mais recondito das montanhas de frutas e verduras, e os pimentoes vermelhos, e as azeitonas temperadas, e toda nudez daquelas carnes polpudas, sangrentas, sem pele e sem vergonha que balancavam nos ganchos das feiras, e todos os temperos, e os pos, especiarias, ate o dissolver dos sentidos, ate quase o desmaio, toda sorte de tentacoes lascivas que lhe lancava esse mundo amargo, azedo e salgado, e tambem a fragancia pungente do cafe que a penetrava ate o fundo do ventre, e as grandes jarras de vidro cheias de bebida de mil cores, e nelas pedacos de gelo e limao, e os carregadores do mercado, robustos, bronzeados, peludos, nus da cintura para cima, com todos os musculos das costas tremendo pelo esforco sob a pele quente, reluzindo ao sol, ensopada de suor."

A citacao eh longa, eu sei. Nela, do angulo que vivo em Jerusalem, nao ha nada que possa ser retirado. A descricao de Amos corresponde exatamente a que tambem podemos encontrar agora se sairmos daqui da minha casa em Katamon e formos para o Quarteirao Arabe na Cidade Velha.
Ha muito tempo  venho caminhando e fotografando pelo bairro arabe. Desde que pisei ali, pela primeira vez, senti uma especie  de riso maduro, e continuei caminhando como quem sente os pes sendo arrancados do chao antes de cada passo no Mercado Central, Salvador. Sim, ali nao havia os negros do Pelo, as baianas cheias de dentes e malevolencia. Mas havia as cores, os suores, os musculos , os gritos misturados aos risos e muita, muita gente colorida e sadia e eu estava em casa, de novo quem diria, serpenteando feliz pela minha e pela sensualidade alheia.

Logo que cheguei aqui em Jerusalem fui alertada pelo meu namorado da epoca que nao era para eu ir ao Kotel, se sozinha, pelo bairro arabe. Foi uma boa pedida porque aprendi a andar pelo bairro ortodoxo. Ele me dizia, para o meu bem ( e, hoje sei, para o bem dele) que sozinha era perigoso porque eu poderia ser sequestrada ou coisa assim. As mulheres religiosas judias que conheci logo que cheguei  advertiram o mesmo, mas,  acrescentaram que era para eu ter cuidado com os homens arabes que "pegavam" mulheres sozinhas nas vielas do Shuk. Entao, a primeira vez que errei o caminho -guiada pelo meu sensato inconsciente- e me perdi nas vielas arabes, lotadas de homens (entenda, lotadas mesmo, o Shuk arabe eh um lugar masculino, nao ha mulheres trabalhando nas lojas por la) percebi rapidamente que eu estava ali caminhando pela minha propria sensualidade que jah vinha escaldada de uma Bahia de feiras e pessoas livres, sem camisas, de saias muito curtas e esbanjando vida. Entendi instantaneamente porque as ruas do mercado arabe nao sao para todo mundo: nao eh um simples passeio  caminhar pela sua propria sexualidade. Eh menos assustador na nudez  e menos feminino do que na Bahia. Para mim, a diferenca, e por isso, o encantamento, estava exatamente no masculino dessas ruas arabes o que gera uma forca bruta, forte, e risonha mesmo assim . Notavel. Parece que quanto mais as mulheres islamicas andam cobertas mais os homens sao descobertos na fala, no olhar, no riso. Elas se cobrem e eles sao nus. Completamente ao contrario do Brasil onde as mulheres sao nuas e os homens cobertos e nada parecido com a Bahia onde todo mundo esta nu o tempo todo. Entenda: quero dizer com "nu" o mesmo que diria sobre  a disposicao e encontro de cada pessoa com a sua sexualidade. Entenda tambem: a Bahia, para mim, nao eh Sao Paulo, Brasil.

Ha poucas mulheres islamicas por ali. O lugar eh deles, homens. Voce as ve, completamente cobertas, comprando ou olhando roupas. Algumas sao mais idosas e podem vender suas ervas e folhas de uvas estendidas no chao em cima de tecidos dolorosamente descorados pelo sol. Somente. As pequenas e escuras ruas do Shuk arabe sao dos homens e dos turistas que andam, obviamente, de bermudas, blusa sem manga e chinelos com todos os tornozelos a mostra. O unico inimigo ali, no Shuk arabe, eh a sua sexualidade caso voce se intimide com a sua  incontrolavel natureza e fracas redeas. Vovo Shlomit tinha razao em sentir vontade de desmaiar e o cheiro do cafe arabe, moido na hora seus graos, ai, sobe pelas trompas ateh atingir o utero.  Nenhum pudor. Estonteante.

Tenho uma unica amiga aqui e ela eh judia religiosa. Toda sexta de manha ela me telefona para me desejar Shabat Shalom e toda sexta de manha eu estou no bairro arabe, fotografando. Ela, que sabe disso, diz: "Shlomit, sai dai, eh perigoso" e eu, andando de telefone na mao, digo, toda sexta feira: " o dia que vc vier aqui voce nunca mais vai embora", rindo. Minha amiga graceja e pergunta toda sexta feira: "Por que?". Toda sexta feira eu respondo "eles sao fortes, morenos, cabelos negros, olhos profundos e sacanas...". Minha amiga querida, entao, ri prazeirozamente ao telefone e completa, muito seria, ja de volta para seu gueto: " cuidado, Shlomit..."

Sim, eles sao descarados. Querem namorar, trepar, casar, ter filhos em meio minuto . Quase ninguem usa alianca por essas bandas e entao a pergunta mais comum eh " voce e casada?" para os mais destemidos ou " voce tem filhos?" eh a sutil pergunta dos mais timidos. Se voce diz nao comeca, entao, uma recepcao cheia de riso e acrescentada de  entao vamos casar e apontam a mesquita mais proxima. Se voce ri eles riem ainda mais. E fica por isso mesmo. Eh uma brincadeira sensual assim como os pedreiros, em toda cidade do Brasil, assobiam e proferem palavras chulas ou toscas para as mulheres que passam. Igualzinho. Nada demais. Eles estao ali trabalhando, ganhando a vida, e tudo o que querem eh vender suas mercadorias aos turistas. No meio disso, se divertem cantando todas as mulheres que passam. Sao alegres e bem armados de alegria o que acaba constratando com os soldados verdes, israelenses, que estao perambulando ou parados nas vielas ou esquinas mais importantes com suas metralhoras imperiosas e seus ombros apolineos bem treinados, a fase disciplinadamente severa e os olhos atentos. Qualquer coisa que por ventura, possa acontecer ali, simplesmente nao acontece, o exercito israelense estah ali, ora bolas, para defender qualquer mocinha de boa familia que possa vir a ser sequestrada ou bombardeada pelo colorido e sensualidade arabescas. Um perigo como os arabes jogam suas sensuais cantadas sem muita precisao atingindo alvos brancos, madeixas virgens, cuidado, nao faca esse caminho, voce pode gostar das cores, dos gorjeios e dos trinados. Nao passe pelo Shuk na Cidade Velha em Jerusalem se voce nunca foi a Bahia, aquela, que como dizia meu bom e ex marido Eduardo Sinquevisque, so se pode ir com crase. Regua e Compasso,  Gil tem toda razao, soh a Bahia, dadeira, com seus  dindins, dadis, pode ofertar. 

Ha em meio a toda essa algazarra um codigo de etica que aprendi com o Samir. Se voce, por acaso, diz a eles que possui um namorado, eles nao se importam e continuam seu gorjeio. Mas se voce diz que possui um namorado "muslim", ou " arabe", eles perguntam nome e sobrenome, onde mora e estando a resposta coerente (sim, existe aquele nome, aquele sobrenome e aquele lugar), param de falar com voce e lhes dao imediatamente as costas como se voce nunca estivesse estado ali. Nao somente nessa situacao. Em qualquer situacao. Trabalhei outro dia numa casa onde havia alguns arabes tambem. Eles foram muito simpaticos comigo, dividiram sua comida, fizeram cafe, ateh ouvirem eu falar ao telefone com o Samir. A partir dali eu me tornei um ser humano invisivel desprovido de  cafeina. Tentei entabular uma conversa em vao, como uma Alice. Telefonei para o Samir, reclamando. Ele riu: "Eu disse, Shlomit. Tome seu cafe na makolet da esquina. Eles nao vao mais falar com voce."

* atraves de Andre de Leones que tem abastecido minhas leituras. Andre chegou com uma mala de livros com algumas roupas pelo meio. Creio que as roupas faziam papel de escora para que os livros nao quebrassem. Fiquei tao extasiada frente aquela mala que a fotografei sem piedade alguma.



quinta-feira, 4 de junho de 2009

Poucas e boas

 (A Arquiteta Ana Villanueva antes de sentar para escrever o Doutorado da Unicamp)


Quase tudo parece caminhar, digo, vai caminhando assim:

Amilcar Torrao vai para Berlim falar, expor, mas sobretudo, vai de novo viajar por causa da sua habilidade academica com os Viajantes que me perseguem. Minha humanidade nao os suporta enquanto caminho a cada passo em Jerusalem, me desviando de turistas com seus portes de arma fotografica, me relembrando cada paragrafo da colecao Viajantes da Edusp, que ficavam na minha estante enquanto suas lombadas descoravam em latitudes e longitudes. Mas Amilcar deu a volta por cima e se vinga dos viajantes, viajando.;)

Andre de Leones, por sua vez, vai virar objeto de tese no Estados Unidos. Uma mariposa procurava lampada, opa (pra usar um termo do Andre), uma pesquisadora americana, pelo visto, achou luz quando encontrou a obra do Andre.

Ja Ana Villanueva (foto acima) escreveu um email que deveria virar epigrafe obrigatoria de toda monografia do   mulherio na Universidade:


"0i
minha tese ta ficando linda.....--
e eu feia...
bjs
Ana Villanueva"